ALTERA A LEI 8591 DE 29 DE OUTUBRO DE 2019 PARA INCLUIR O
ACOLHIMENTO PSICOSSOCIAL DE FAMILIARES DE POLICIAIS ASSASSINADOS NO ÂMBITO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Autor(es): DeputadoRENATA SOUZA
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RESOLVE:
Art. 1º Acrescenta os parágrafos 1º e 2º ao art. 7º da Lei 8591, com a seguinte redação:
“ (...)
§ 1º O Serviço de Acolhimento Emergencial em Saúde Mental se estenderá ao atendimento dos familiares dos agentes falecidos em decorrência de suicídio ou dos agentes vítimas de homicídio ocorrido em consequência do exercício profissional, pelo período que, clinicamente, se faça necessário.
§2º Compreende-se por familiares o cônjuge, independente de existência de casamento ou declaração de união estável, bem como os ascendentes e descendentes, podendo-se estender a familiares de outros graus, mediante necessidade clínica atestada por profissional habilitado."
Plenário Barbosa Lima Sobrinho, 16 de dezembro de 2019.
RENATA SOUZA
Deputada (Psol)
JUSTIFICATIVA
Em 2020, 39 policiais militares perderam suas vidas, esse resultado trágico ilustra uma política que submete o trabalhador da segurança a viver sob risco constante.
Desnecessário dizer que tal realidade gera impactos também para os familiares desses agentes.
Destaco aqui trecho do relatório anual da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, publicado no dia 10 de dezembro deste ano *1 :
“Mais de trinta anos depois da promulgação da primeira constituição a ter um capítulo sobre segurança pública, a Constituição Cidadã de 1988,
ainda não temos uma arquitetura institucional adequada, por onde possa fluir algo parecido com uma política pública nessa área fundamental. Na
ausência de elementos estruturantes para lidar com a questão, as instituições de segurança pública acabam por ter uma atribuição
desmedida e o modo de atuação dessas forças acaba vincado pelo confronto armado como resposta estatal quase que exclusiva.
O resultado de todo esse descalabro são números impressionantes.
Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), entre janeiro e outubro do ano de 2020, foram cometidos 4094 crimes classificados sob a
designação “letalidade violenta” no território do Estado do Rio de Janeiro, uma categoria que compreende quatro ilícitos penais: o
homicídio doloso, a lesão corporal seguida de morte, o latrocínio e as mortes decorrentes de intervenção de agente estatal. No mesmo
período, 15 policiais morreram em serviço, entre civis e militares, segundo a mesma fonte.
O resultado cruel de um processo de subjetivação conduzido pela presença constante do conflito, é que, sobre este ambiente de trabalho,
permanece um estado de desespero e tudo o mais que essa ambiência engendra: adoecimento físico e psíquico. Nesse sentido, uma pesquisa
realizada no Rio de Janeiro pelo Laboratório de Análise da Violência, da UERJ, publicada em 2016, demonstrou: o elevado nível de sofrimento
proporcionado pelo trabalho policial no estado, nos altos índices de comportamento e ideações suicidas entre os profissionais de Polícia
Militar. De acordo com o estudo, as principais causas do fenômeno seriam a insatisfação com o trabalho (sacrifício inútil); com as amizades
de trabalho (relacionamento interpessoal) e com os recursos materiais oferecidos pela instituição.”
Diante deste cenário, faz-se necessário a constituição de mecanismos de acolhimento psicossocial dos familiares de policiais, que passam pelo traumático processo de perda.
DISPÕE SOBRE A CRIAÇÃO DO PROGRAMA DE PREVENÇÃO DE VIOLÊNCIAS AUTOPROVOCADAS OU AUTOINFLIGIDAS, COM A FINALIDADE DE ATENDER E CAPACITAR O POLICIAL CIVIL, POLICIAL MILITAR, BOMBEIRO MILITAR, INSPETOR PRISIONAL OU AGENTE DO DEPARTAMENTO GERAL DE AÇÕES SÓCIO-EDUCATIVAS (DEGASE) NO ÂMBITO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, PARA O AUXÍLIO E O ENFRETAMENTO DA MANIFESTAÇÃO DO SOFRIMENTO PSÍQUICO E DO SUICÍDIO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica instituído o Programa de Prevenção de Violências Autoprovocadas ou Autoinfligidas, com a finalidade de atender e capacitar o policial civil, policial militar, bombeiro militar, inspetor prisional e agente do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE), para o auxílio e o enfrentamento da manifestação do sofrimento psíquico e do suicídio.
Parágrafo único. O presente programa seguirá as previsões estabelecidas na Lei Estadual 7.883/2018, que instituiu o Programa de Segurança e Saúde no Trabalho dos Agentes de Segurança Pública, normatizando o instituído no seu artigo 8º, inciso V, que trata da criação de programas de prevenção ao suicídio.
Art. 2º A prevenção da violência autoprovocada observará os seguintes princípios:
I – a dignidade humana;
II – proximidade;
III – ações de sensibilização dos agentes;
IV – informação;
V – sustentabilidade;
VI – evidência científica.
Art. 3º A prevenção das violências autoprovocadas ou autoinfligidas observará as seguintes diretrizes:
I – a perspectiva multiprofissional na abordagem;
II – atendimento e escuta multidisciplinar;
III – a discrição no tratamento dos casos de urgência;
IV – a integração das ações;
V – a institucionalização dos programas;
VI – o monitoramento da saúde mental do policial civil, policial militar, bombeiro militar, inspetor prisional e agente do Departamento geral de Ações Socioeducativas (DEGASE), através do Serviço de Atenção à Saúde do Policial (SASP);
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, as avaliações psicológicas não terão caráter compulsório.
Art. 4º Consideram-se violências autoprovocadas:
I – o suicídio: a violência fatal autoinfligida, deliberadamente empreendida e executada com pleno conhecimento;
II – a tentativa de suicídio;
III – as autolesões, com ou sem a intenção de se matar;
IV – a ideação suicida: o pensamento recorrente de se matar.
Art. 5º A prevenção das violências autoprovocadas é destinada a alterar a conduta, as atitudes e a percepção dos membros profissionais quanto ao comportamento suicida e será desdobrada em programas de prevenção primária, secundária e terciária.
§ 1º A prevenção institucional das violências autoprovocadas ou autoinfligidas deverá compor seis dimensões integradas:
I – incentivo à gestão administrativa humanizada;
II – formação e treinamento baseados nos preceitos da prevenção;
III – atenção ao profissional que tenha se envolvido em ocorrência de risco e experiências traumáticas;
IV – coleta, validação, notificação e sistematização de dados de morte por suicídio, homicídios seguidos de suicídio e tentativas de suicídio;
V – assistência à saúde mental.
§ 2º A prevenção primária destina-se a todo o efetivo e será constituída por ações de promoção da saúde física e psíquica, através das seguintes medidas de proteção:
I – estímulo ao convívio social, proporcionando a aproximação da família;
II – promoção da qualidade de vida, estimulando a prática da atividade física regular;
III – estímulo à religiosidade, como possibilidade de espaço de acolhimento, respeitando as convicções de crença e individuais dos agentes;
IV – elaboração e/ou divulgação de programas de conscientização, informação e sensibilização sobre o tema do suicídio;
V – realização de ciclos de palestras e campanhas que sensibilizem e relacionem qualidade de vida e ambiente de trabalho;
VI – abordagem da temática da saúde mental em todos os níveis de formação e qualificação profissional;
VII – promoção de encontros temáticos relacionados à qualidade de vida no trabalho e à saúde mental;
VIII – criação de um espaço apartado do ambiente das corporações destinado a ouvir o agente, onde ele se sinta seguro para conversar sobre seus problemas.
§ 3º A prevenção secundária visa atingir os grupos de profissionais que já se encontram em situação de risco de práticas de violência autoprovocadas ou autoinfligidas, através das seguintes medidas de proteção:
I – criação de programa de prevenção e atenção ao uso e abuso de álcool e outras substâncias entorpecentes;
II – acompanhamento psicológico e religioso regular, respeitando convicções e crenças, para profissionais que estejam respondendo a processos;
III – organização de uma rede de cuidado como fluxo assistencial que permita o diagnóstico precoce dos profissionais em situação de risco, envolvendo toda corporação, para sinalizar a mudança de comportamento ou a preocupação com o colega de trabalho;
IV – educação financeira, com vistas a prevenir o sofrimento psíquico provocado pelo super endividamento.
§ 4º A prevenção terciária tem o objetivo de atender aos profissionais que tenham comunicado ideação suicida ou tentado suicídio, através das seguintes medidas de proteção:
I – o Núcleo do Serviço de Psicologia e Social deverá buscar aproximação e fortalecimento da família na participação e acompanhamento do caso e no processo de tratamento do agente;
II – a chefia deverá coibir práticas que promovam alguma forma de isolamento, desqualificação ou discriminação contra os profissionais que tenham enfrentado o problema;
III – restrição do uso e porte de arma de fogo.
Art. 6º Para a operacionalização do programa instituído por esta lei, o Poder Executivo poderá, através da Secretaria de Polícia Militar, Secretaria de Polícia Civil, Secretaria de Defesa Civil e Corpo de Bombeiro Militar, Secretaria de Administração Penitenciária e/ou a Secretaria de Vitimização e Amparo à Pessoa com Deficiência, criar o Serviço de Acolhimento Emergencial em Saúde Mental, destinado à construção de protocolos e estratégias de implementação à prevenção do suicídio.
Art. 7º São atribuições do Serviço de Acolhimento Emergencial em Saúde Mental:
I – construir um protocolo de atendimento dos casos de emergência psiquiátrica que envolvam o comportamento suicida;
II – capacitar os profissionais de saúde das instituições para a identificação dos profissionais em risco de cometimento de atos de violência autoinfligida;
III – realizar palestras nas Corporações, a respeito da prevenção de violências autoinfligidas;
IV – preparar profissionais para atuarem como multiplicadores junto a suas equipes e Unidades, de modo que a prevenção e o protocolo de atendimento sejam institucionalizados;
V – formular ações para a sensibilização do efetivo no que se refere à identificação e ao encaminhamento dos casos de risco;
VI – capacitar os profissionais para identificar situações de risco de suicídio;
VII – articular-se com a rede pública de saúde;
VIII – mapear os leitos de internação psiquiátrica na rede pública de saúde;
IX – acompanhar, através de visitas e do contato com os familiares, os profissionais internados na rede pública;
X – realizar coleta sistemática de informações de mortalidade violenta e intencional pelo policial civil, policial militar, bombeiro militar, inspetor prisional e agente do Departamento geral de Ações Socioeducativas (DEGASE) visando mensurar o impacto do serviço através da construção de indicadores de violência autoinfligida;
XI – criar um instrumento de notificação dos casos de ideação e tentativa de suicídio, resguardando a identidade do profissional.
Art. 8º O Poder Executivo, através Secretaria de Polícia Militar, Secretaria de Polícia Civil, Secretaria de Defesa Civil e Corpo de Bombeiro Militar, Secretaria de Administração Penitenciária e/ou a Secretaria de Vitimização e Amparo à Pessoa com Deficiência, poderá celebrar convênios com instituições do sistema público de saúde, a fim de realizarem em conjunto as atividades e programações definidas nesta lei.
Art. 9º Poder Executivo deverá adotar as medidas necessárias para a regulamentação desta Lei.
Art. 10 Esta Lei entrará em vigor na data da sua publicação.
Rio de Janeiro, em 29 de outubro de 2019.
WILSON WITZEL Governador
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Informações Básicas
Código
20200303480
Autor
RENATA SOUZA
Protocolo
25444
Mensagem
Regime de Tramitação
Ordinária
Link:
Datas:
Entrada
16/12/2020
Despacho
16/12/2020
Publicação
17/12/2020
Republicação
Comissões a serem distribuidas
01.:Constituição e Justiça 02.:Saúde 03.:Segurança Alimentar