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INSTITUI O PROGRAMA DE ACOLHIMENTO EM SAÚDE MENTAL PARA A JUVENTUDE DAS FAVELAS, NO ÂMBITO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. |
Parágrafo único. O Programa é baseado nos princípios da integralidade e universalidade do acesso à saúde e tem como objetivos a criação, a ampliação e a articulação de pontos de atenção à saúde para a juventude em sofrimento psíquico das favelas e periferias.
Art. 2º A implementação deste Programa terá como principal objetivo ampliar e qualificar a oferta de estratégias de cuidado e promoção de saúde mental de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, prevenindo o adoecimento ou agravo de sofrimento psíquico.
Parágrafo único. Considera-se público-alvo deste Programa, crianças, adolescentes e jovens na faixa etária de 10 a 29 anos.
Art. 3º O Programa será executado através da articulação entre Rede de Atenção Psicossocial e a Rede de Proteção de Crianças e Adolescentes, incluindo equipamentos como os Conselhos Tutelares; Juizados Especiais; Centros de Referência Especial da Assistência Social (Creas); Centros de Referência da Assistência Social (Cras); Centros de Atenção Psicossocial infanto juvenis; Hospitais Gerais; Unidades de Saúde da Família; Escolas; Associações de Moradores; Abrigos; Unidades de Medidas SocioEducativas; Delegacias; Ministério Público; Defensoria Pública; Casas da Juventude; Conselhos da Juventude; Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca); Famílias Acolhedoras, e demais serviços envolvidos neste acolhimento.
Parágrafo único. Deverão ser fortalecidos os vínculos com as entidades municipais responsáveis pelos serviços listados, podendo o executivo estadual atuar de maneira a suplementar carências destes.
Art. 4º Para a implementação e o desenvolvimento desse Programa, deverão:
I- ser otimizados esforços junto a Rede de Atenção Psicossocial pública e Rede de Proteção Social básica e especial, em especial os Centros de Atenção Psicossocial Infantis - CAPSIs;
II- ser realizados convênios e/ou outras formas de parceria com organizações não-governamentais, universidades e instituições de ensino públicas e privadas, órgãos governamentais e demais setores da sociedade civil, presentes no território de origem do público-alvo a fim de ampliar a oferta de estratégias de cuidado e a promoção da saúde mental de crianças, adolescentes e jovens de comunidades e áreas vulneráveis;
III- ser mobilizados adolescentes e jovens, assegurando a participação cidadã na construção de políticas públicas que tenham como objeto o conjunto de direitos que lhes diz respeito.
Art. 5º O Programa deverá ser desenvolvido por uma equipe multidisciplinar composta por: psicólogos, terapeutas e assistentes sociais, sem prejuízo de outros profissionais que se fizerem necessários à sua implementação e desenvolvimento qualificado.
Art. 6º Durante o desenvolvimento do Programa, dados serão coletados através de pesquisas quantitativas e qualitativas e deverão compor um relatório anual acessível por qualquer interessado através de publicação no Diário Oficial do Executivo e em sítios específicos relacionados à temática, objeto do Programa.
Art. 7º A periodicidade da divulgação do relatório não poderá ser superior a doze meses.
Art. 8º As despesas decorrentes desta lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.
Art. 9° Esta lei deverá ser regulamentada pelo Executivo e entrará em vigor na data de sua publicação.
Plenário Barbosa Lima Sobrinho, 12 de agosto de 2021.
DEPUTADA RENATA SOUZA
Conforme estudo da FIOCRUZ (2020), “Estima-se, que entre um terço e metade da população exposta a uma epidemia pode vir a sofrer alguma manifestação psicopatológica, caso não seja feita nenhuma intervenção de cuidado específico para as reações e sintomas manifestados”. Muitos medos podem afetar a saúde: o medo de adoecer ou morrer, medo de perder pessoas que amamos, medo de ser excluída(o) por estar com a COVID-19, medo de transmitir o vírus a outras pessoas. E a partir desses medos, seguem-se também reações como irritabilidade, angústia, tristeza, que podem provocar distúrbios do sono, do apetite, pensamentos recorrentes sobre epidemia, saúde da família, morte.
Além do impacto geral sobre toda a população, há determinados grupos que sofrem de maneira particular e que merecem uma atenção específica: crianças, adolescentes e jovens, principalmente aqueles(as) de comunidades e áreas mais vulneráveis. Em setembro de 2020 foi realizada uma enquete pelo UNICEF (U-REPORT BRASIL, 2020) com adolescentes e jovens questionando se “Durante o período da pandemia, eles sentiram necessidade de pedir ajuda em relação ao seu bem-estar físico e mental?”. Dos 2.012 respondentes, 72% disseram que sim, sentiram necessidade de buscar ajuda. E, quando perguntados para quem solicitaram ajuda, 41% disseram que não haviam buscado, 36% buscaram amigos/as, namorados/as, 13% procuraram por referências online, por telefone, ou adultos do setor público. Essas informações corroboram a necessidade de se ter espaços seguros de acolhimento em saúde mental para adolescentes e jovens em seus territórios.
Uma profusão de fatores afeta a saúde mental dessa população: confinamento prolongado em espaços exíguos, distanciamento da rede sócio-afetiva (outros parentes, vizinhos, colegas), exposição constante a notícias avassaladoras sobre a doença, quebra de expectativas e perspectivas sobre o futuro, interrupção das aulas presenciais por mais de um ano e subsequente quebra do vínculo com a instituição de ensino, aumento do desemprego de pais e cuidadores e da fome - visto que para muites, a merenda escolar é uma das principais refeições -, violência intra-familiar, persistência da violência cometida por policiais nas comunidades, contrariando orientações do STF (ADPF 635, de 4/ago/2020).
De acordo com relatório do Ministério da Saúde (BRASIL 2018), citado pela organização não governamental LUTA PELA PAZ 2021 (UNICEF 2021a, p. 18) "a cada dez adolescentes ou jovens que se suicidam no Brasil, seis são negros, e que o risco de um adolescente ou jovem negro cometer suicídio é 45% maior que de um adolescente ou jovem branco" (BRASIL, 2018a). E quando se trata de violência de Estado, essa realidade também se estende a jovens negros da favela, que são os primeiros a sentirem os reflexos de um ethos militarizado, conforme afirma SOUZA (2020, p. 168), “são esses jovens as vítimas prioritárias da política de segurança militarizada do Estado. E a consequência imediata é a criminalização da pobreza, com a juventude negra sendo tratada como ‘suspeita’ por viver e existir nas favelas.”
Em pesquisa realizada pelo projeto Criando Redes (UNICEF, 2021b) com jovens da Maré, dados evidenciam como os conflitos armados e a má estratégia de segurança pública que a comunidade enfrenta causam uma mudança repentina na rotina local, fechamento de escolas, suspensão do comércio, cancelamento das atividades da clínica da família e também das áreas de lazer e cultura. Moradoras(es) são assassinadas e bens pessoais destruídos, e a soma de todos esses fatores pode provocar, além de sentimentos negativos, um grande desgaste emocional. Segundo a jovem Elen Batista, moradora do Complexo da Maré:
a angústia aumentam nesses momentos. (...) o descaso do governo para a
educação também é motivo de frustração, angústia e tensão, infelizmente, as
chances de almejar algo maior são pequenas para quem mora aqui”
Nesse sentido, têm surgido projetos de protagonistas das próprias comunidades e áreas vulneráveis, que em conjunto com iniciativas governamentais e até internacionais, vêm reduzindo a vulnerabilidade dessa população por meio da abertura de espaços de acolhimento que sejam participativos, com foco na redução das vulnerabilidades e na prevenção à saúde, e com o envolvimento de diversos atores do território inclusive crianças, adolescentes, jovens e suas famílias (UNICEF 2021a, p. 27). Assim, se torna fundamental que o poder público incentive, promova e apoie tais iniciativas que são objeto deste projeto de lei.
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REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério da Saúde. Óbitos por suicídio entre adolescentes e jovens negros 2012 a 2016: MS, 2018.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução nº 4, de 26 de março de 2020. Dispõe sobre regulamentação de serviços psicológicos prestados por meio de Tecnologia da Informação e da Comunicação durante a pandemia do COVID-19. Disponível em: https://atosoficiais.com.br/cfp/resolucao-do-exercicio-profissional-n-4-2020-dispoe-sobre-regulamentacao-de servicos-psicologicos-prestados-por-meio-de-tecnologia-da-informacao-e-da-comunicacao-durante-a-pandemi a-do-covid-19?origin=instituicao&q=004/2020. Acessado em: 26 abr. 2021.
FIOCRUZ. Saúde mental e Atenção Psicossocial na Pandemia COVID-19: Recomendações aos psicólogos para o atendimento online: Brasília, 2020. Disponível em: <https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/wp-content/uploads/2020/04/Sa%C3%BAde-Mental-e-Aten%C3%A7% C3%A3o-Psicossocial-na-Pandemia-Covid-19-recomenda%C3%A7%C3%B5es-gerais.pdf> Acessado em: 26 abr. 2021.
SOUZA, Renata. Cria da favela: resistência à militarização da vida. 2. ed. - São Paulo, Boitempo, 2020.
UNICEF. Guia Metodológico de Saúde Mental. Projeto “CRIAndo Redes”, Coord. Luta pela Paz 2021 / Observatório de Favelas e Redes da Maré, 2021a. Disponível em PDF: https://www.unicef.org/brazil/media/14076/file/guia-metodologico-em-saude-mental_criando-redes.pdf Acessado em: 06 maio 2021.
UNICEF. Enquete sobre saúde mental com jovens da Maré. Projeto “CRIAndo Redes”, Coord. Luta pela Paz 2021 / Observatório de Favelas e Redes da Maré, 2021b. Disponível em PDF: https://drive.google.com/file/d/1C_Xa2RJvFVyboOOELeFcAtr0qfF2NHb6/view
U-REPORT BRASIL. Saúde mental na quarentena. 2020. Disponível em: http://brasil.ureport.in/opinion/1932/. Acessado em: 09 agosto 2021.
Podcast realizado por jovens da Maré que debateram questões de saúde mental, cuidado e acesso a serviços: https://anchor.fm/luta-pela-paz/episodes/MOBcast-Ep01---Sade-Mental-evgf6c . Acessado em: 06 maio 2021.
Código | 20210304634 | Autor | RENATA SOUZA |
Protocolo | 34157 | Mensagem | |
Regime de Tramitação | Ordinária |
Link: |
Datas:
Entrada | 12/08/2021 | Despacho | 12/08/2021 |
Publicação | 13/08/2021 | Republicação |